sábado, 30 de julho de 2016

HISTÓRIA DA MENINA LOUCA





Procuraram toda a casa, toda a terra,
Ninguém a achava.
Ela estava no telhado atrás da chaminé.
Olhava as estrelas e cantava.
Estava tão feliz e sossegada!
Olhava as estrelas e cantava.
Meu Deus, está louca!
Vamos levá-la.
Estava tão feliz!
Olhava as estrelas e cantava...
Falas-me em asas,
Em voar...
Não vês que eu não sou nada,
Nem anjo nem pessoa,
Nem ave nem engenho,
Que é totalmente outra a minha definição?
Eu não sou mais do que o próprio chão...
A minha vida é poética:
Paira entre a vaga mentira e a realidade.
O amor me acontece
Como as folhas às árvores,
E tão singularmente,
Que já nem sei se é natural à árvore ter folhas
Ou estar nua...

Ana Hatherly

domingo, 17 de julho de 2016

GRAÇA





Dona Elvira é da Graça
Dá sorrisos a quem passa
Ao lado da sua janela…
Dona Elvira é da Graça
E que graça que ela tem
Quando por graça diz
Que o tempo demora na Graça
E se pendura à janela
Só para falar com ela…

terça-feira, 12 de julho de 2016

ERA UMA CONCHINHA





Era uma conchinha
Perdida na areia…
Dizem que já foi
Colar de sereia…
Que a deixou na praia
Em noite de luar
Quando o seu amor
Veio procurar…
E como o seu amor
Não apareceu…
Deixou na conchinha
O beijo azul que lhe não deu…

sexta-feira, 8 de julho de 2016

TREPAM SORRISOS PELA TARDE...


   
Aydin (Turquia) – Crianças subindo escada de mesquita



 Pendurados na brisa
Trepam sorrisos pela tarde…
Que Deus pode ter vários nomes
Mas os anjos são iguais em toda a parte…




segunda-feira, 4 de julho de 2016

TENHO TANTO QUE BRINCAR…





“Quando for grande, não quero ser médico, engenheiro ou professor.
Não quero trabalhar de manhã à noite, seja no que for.
Quero brincar de manhã à noite, seja com o que for.
Quando for grande, quero ser um brincador.
Ficam, portanto, a saber: não vou para a escola aprender a ser um médico, um engenheiro ou um professor.
Tenho mais em que pensar e muito mais que fazer.
Tenho tanto que brincar, como brinca um brincador, muito mais o que sonhar, como sonha um sonhador, e também que imaginar, como imagina um imaginador…
A mãe diz que não pode ser, que não é profissão de gente crescida. E depois acrescenta, a suspirar: “é assim a vida”. Custa tanto a acreditar. Pessoas que são capazes, que um dia também foram raparigas e rapazes, mas já não podem brincar.
A vida é assim? Não para mim. Quando for grande, quero ser brincador. Brincar e crescer, crescer e brincar, até a morte vir bater à minha porta. Depois também, sardanisca verde que continua a rabiar mesmo depois de morta. Na minha sepultura, vão escrever: “Aqui jaz um brincador. Era um homem simples e dedicado, muito dado, que se levantava cedo todas as manhãs para ir brincar com as palavras.”



                                                                      Álvaro Magalhães