sábado, 28 de junho de 2014

APAGARAM O TEU ABRAÇO


GRAÇA MORAIS


As borboletas apagaram o teu abraço. Aquele que nunca chegaste a dar-me e que guardava embrulhado no xaile de lã no canto do armário.

Hoje, quando arrumava as saudades e procurei no xaile o abraço que me aconchegava a espera, reparei que as traças o tinham apagado por entre os fios de lã.

E eu fiquei sem nada!

quinta-feira, 26 de junho de 2014

RUA DA ESCOLA





A rua da escola ficou sem escola!

Bem, o edifício está lá como sempre esteve, mas o silêncio já não tem corridas e risos de meninos a palmilhar-lhe a rua, a passar o portão para o enorme recreio. Até as árvores têm menos pássaros, estes vinham juntar-se aos gritos e risos felizes dos meninos, partilhar com eles a merenda e os voos…

Os pássaros perguntam-se onde andarão os meninos com sol e sonhos nos olhos?!

Não sabem os pássaros que agora são transportados de autocarro para a escola da cidade. A escola maravilha onde há enormes bibliotecas, todo o material necessário e mais algum, mesmo que não faça falta para nada. Uma escola onde o quadro já não é riscado a giz e em abono da verdade já não se sabe muito bem quem risca!

E muito importante para a formação pessoal e social do individuo, dizem, é que todos vão ter inglês! Muitas, muitas horas de inglês e português e matemática… Bom, para descontrair haverá também umas pouquitas horas de educação física, é preciso quebrar um pouco a energia e evitar os problemas disciplinares e outros similares!

Ainda segundo os entendidos neste tipo de escola maravilha, as salas de aula são muito espaçosas e com todas as condições para aquilo que interessa de facto, aprender. Já os recreios…

Os recreios não fazem falta nenhuma para aquilo que realmente importa aprender! Por isso quase nem existem, afinal que professor incompetente, vai levar as crianças até ao recreio quando dentro da sala de aula é que se está bem! A quem vão interessar os pássaros, essas criaturas que não ensinam nada a ninguém. Já por isso os recreios da escola maravilha não têm árvores, só uns arbustos que o verde fica sempre bem, mas que não seja precisa muita terra, que a terra levanta pó e danifica o cimento do chão, o cimento que se colocou também para tapar as pedras, essas coisas inúteis que só servem para tropeçar…

E ao final do dia, quando regressarem a casa os meninos já não terão força para procurar os pássaros nas árvores da aldeia e aos poucos e poucos talvez se esqueçam deles tão embrulhados que estiveram com as coisas importantes da matemática, do inglês…

Mas no recreio da escola, da rua da escola, os pássaros vão continuar à espera dos gritos e risos dos meninos…

Quem sabe se ao menos um vai lembrar-se do caminho...



terça-feira, 24 de junho de 2014

LUA DE S. JOÃO


    ( Imagem retirada da web )



A menina roubou a lua
Confundiu-a com um balão
Um balão iluminado
Da noite de S. João

A lua até achou graça
E entrou na brincadeira
Não só cantou e dançou
Como saltou a fogueira

E já bem de madrugada
Estava o sol a sorrir
A lua voltou ao céu
E a menina foi dormir

quarta-feira, 18 de junho de 2014

" SE EU TIVESSE UM POMAR ELE ESTARIA SEMPRE EM FESTA..."





Se eu tivesse um pomar, um pequeno pomar que fosse, não lhe poria grades à roda, como os outros proprietários. Não poria, a guardá-lo, um desses cães enormes, rancorosos, que andam sempre rondando os pomares...
O meu pomar seria assim: todo aberto, para todos.  E, quando o outono chegasse e as árvores ficassem cheias de frutos amarelos e vermelhos, nenhum pobrezinho teria fome, nenhuma criança choraria de sede, passando pelo meu pomar...
E, no inverno, ainda haveria lá onde alguém se abrigasse, quando chovesse muito ou fizesse muito frio...
Se eu tivesse um pomar, ele estaria sempre em festa, cheio de borboletas e de pássaros...
Como eu seria feliz, se tivesse um pomar!

                                                                  Cecília Meireles



domingo, 15 de junho de 2014

DOS MEUS VERSOS HÁ-DE SEMPRE VER-SE O MAR






Dos meus versos há-de sempre ver-se o mar

Há-de haver sempre
Ondas que vão e veem
E um barco a baloiçar com o teu nome

Nos meus versos

Os peixes confundem-se com os pássaros
E as palavras têm nomes de conchas
Que guardam a alma do vento
E sopram a saudade pela praia

Nos meus versos

O sol há-de encostar-se à sombra do silêncio
Como um livro de poemas para ler
Um livro onde as algas marcam as páginas
E as perfumam como se fossem cabelos de sereia

E quando o sol apagar os meus versos
Já as palavras terão aprendido
A desfazer-se em espuma